Neuromatriz da dor, neurônio espelho, movimento ideomotor, modulação neural, hierarquização disfuncional. Se você é fisioterapeuta e trabalha com pacientes com dor e/ou problemas funcionais e não sabe o que essas palavras querem dizer, uma coisa posso lhe assegurar: Seu conhecimento está defasado.
Estas palavras são referencias de novas teorias e conceitos que embasam novas técnicas de abordagem ao paciente com dor e/ou problemas funcionais. Todas se interligam em algum ponto, mas vamos a partir daqui discriminá-las passo-a-passo.
Neuromatriz da dor.
Quando você pensa em fisiologia da dor o que vem sua cabeça? Teoria das comportas? Esta teoria publicada em 1965 Por Ronald MELZACK e Patrick WALL é a teoria aceita até hoje.
Mas você sabia que o próprio Ronald MELZACK já investiga desde os anos 90 uma nova teoria?? É a TEORIA DA NEUROMATRIZ DE MELZACK, onde a dor tem desde ligações sinápticas genéticas até as ligações com as entradas sensoriais. Além destas, os sistemas de regulação do estresse e da cognição também contribuem nesta NEUROMATRIZ. Tudo isso são fatores para que o individuo sinta DOR
Esta neuromatriz que tem uma ampla rede que inclui componentes somatossensoriais, límbicos e corticais, mostra em forma de conjuntos a relação entre as dimensões de percepção de dor onde as características para o entendimento são os dados sensório-discriminativos (S), afetivo-motivacionais(A) e avaliativo-cognitivo (E).
Ou seja, saímos de um conceito onde a dor era pura e simplesmente um estimulo que trafega por vias neurais e que ocorre caso uma “porteira” se abre ou não, de acordo com a fibra ou tipo de estimulo presente ou ativado, para um conceito que se encaixa dentro do que vimos na prática clinica, um emaranhado de linhas e conexões que interferem um sobre os outros. É só lembrarmos o filme Matrix, ninguém até hoje entendeu o filme, e é por isso que a dor é de tão difícil compreensão. A dor é multimodal, onde os funcionamentos de vários sistemas e vários aspectos interferem na percepção da dor (ou seria sensação, mais à frente farei a distinção entre as duas). Podemos ver na imagem acima que desde os receptores sensoriais passando pelos sistemas endócrino e imune até a cognição/emoção interferem sobre a percepção da dor (sim, percepção!!)
Sensação ≠ Percepção
Sensação refere-se à detecção de alguns estímulos na periferia e à transmissão de sinais sensoriais para o sistema nervoso central.
Percepção é o processo de pegar a informação sensorial, filtrá-la, organiza-la e interpretar seu significado para criar uma experiência subjetiva ou consciente relacionada à esta sensação. Por exemplo: Através da sensação os ouvidos dão informações sobre ondas sonoras para o cérebro, e através da percepção é que ouvimos (distinguimos) como sendo música.
No contexto de movimento, a sensação gera informações proprioceptivas, e a percepção cria a cinestesia, ou o sentido do movimento (adução/abdução, flexão/extensão etc.). Para constar, o termo propriocepção pode causar confusão, pois as vezes é usado para referir a uma sensação e as vezes a uma percepção).
A percepção é o produto final de um processamento feito pelo nosso cérebro, portanto, toda a neuromatriz deve ser levada em consideração. Por exemplo, dependendo de nosso histórico (ambiente em que vivemos, experiências passadas) e dos estímulos que temos no dia-a-dia, podemos verificar que duas pessoas podem receber a mesma sensação, mas percebê-la de forma diferente.
Esta percepção está relacionada ao nosso mapa corporal cortical, mais precisamente o córtex pré-frontal (imagens abaixo). Onde estas áreas permanecem presentes devido aos estímulos que damos às respectivas áreas constantemente. Um estudo de Jean Pierre Roll mostra que a imobilidade de um membro priva o SNC de todas as informações sensoriais habitualmente associadas a sua mobilidade e “deleta” no córtex cerebral, a imagem deste movimento. Em outras palavras somente há percepção se houver sensação.
Esta relação de sensação e percepção relacionada à dor faz sentido em vários quadros clínicos. Como a dor é percebida no cérebro, caso o paciente não tenha uma capacidade de percepção ideal, o cérebro não saberá o que fazer com várias sensações ao mesmo tempo, isso pode causar dor crônica.
Ao mesmo passo que em um paciente com dor crônica a percepção passa a ser uma experiência e cria uma nova imagem disso no cérebro, o que faz que a dor seja “normal” e então sensações percebidas passam a ser percebidas e interpretadas e como resposta, provocam persistência da dor. Isto faz com que pacientes com disfunções (não estamos falando de lesões estruturais de tecidos) permaneçam com dor crônica mesmo já adaptada, pois a resposta às sensações será de dor, pois é a experiência que o cérebro está tendo.
Neste sentido devemos também diferenciar uma característica que a maioria aceita, a de que DOR = NOCICEPÇÃO. Geralmente assumimos que as duas são iguais, mas a dor é uma característica consciente e estudos atuais mostram que a nocicepção nem sempre é percebida como dor.
A dor ocorre quando o cérebro detecta perigo aos tecidos corporais e à necessidade de resposta corretiva à este perigo, e não quando há atividade nas fibras nociceptivas ou de acordo com o estado atual dos tecidos.
Esta “confusão” entre dor e nocicepção é comum, pois a linha que divide a dor e a lesão tecidual pelo sistema nervoso e cérebro é muito tênue.
Como conclusão a este tópico, a dor é uma percepção que o cérebro tem de que algo não vai bem, é uma resposta protetora, assim como alguns problemas funcionais. Devemos tratá-los desta forma, não pensando que estes são nossos “inimigos”, mas sim os sinais que nos indicarão o que, onde e quando tratar. A dor é modulada por várias características, cabe a nós verificar onde se encontra a origem dentro da neuromatriz e abordar da forma que acharmos mais conveniente.
As definições para as outras palavras serão detalhadas em publicações mais à frente.
“A mente que se abre a uma nova ideia jamais voltará ao seu tamanho original.”
Albert Einstein
Autor: Lisandro Antônio Ceci